Dois meses após um golpe inesperado por parte do banco que gerenciava suas finanças, a Meati Foods, referência no uso de micélio na produção de carnes alternativas, se prepara para ser vendida por apenas US$ 4 milhões — uma cifra surpreendentemente baixa frente ao seu histórico recente de investimentos e expansão.
A transação foi revelada em documentos apresentados ao Tribunal do Condado de Adams, no Colorado, no dia 2 de maio. Neles, o CEO Phil Graves transferiu os ativos da empresa para o advogado Aaron Garber, que agora conduz o processo de venda. A compradora deve ser uma nova entidade chamada Meati Holdings, embora pouco se saiba sobre quem está por trás dela, segundo o portal BusinessDen.
O objetivo, segundo Garber, é preservar a capacidade operacional da companhia, mitigar perdas para os credores e minimizar impactos negativos para todas as partes envolvidas. Uma decisão judicial ainda precisa autorizar a nova controladora a assumir a operação antes do fechamento oficial do negócio.
A notícia chega com um sabor amargo. Em 2022, a Meati foi avaliada em impressionantes US$ 650 milhões após uma rodada de investimento Série C de US$ 150 milhões — valor que saltou para US$ 250 milhões em 2023, com a extensão da rodada (Série C1). No total, foram US$ 450 milhões captados desde a fundação da empresa, em 2017. Agora, com ativos listados em US$ 158 milhões, o valor da venda é quase simbólico.
Como a Meati chegou até aqui?
No início de 2024, a Meati parecia em plena ascensão. A empresa havia liderado a maior captação do setor no ano, dobrado sua receita e ampliado em 130% sua presença no varejo, com seus produtos — como bifes e hambúrgueres de micélio — disponíveis em mais de 7 mil pontos de venda.
Mas em fevereiro, tudo mudou. O banco responsável pelas contas da empresa retirou, de forma abrupta, dois terços de suas reservas financeiras, alegando um descumprimento contratual técnico, ainda que a empresa estivesse com os pagamentos em dia. A retirada de fundos ocorreu justamente no momento em que a Meati buscava fechar uma rodada interna de investimento que estenderia sua operação até 2026.
Sem capital de giro, a empresa foi legalmente obrigada a emitir um aviso WARN (Worker Adjustment and Retraining Notification), informando a seus 150 colaboradores que todos os empregos estavam em risco. O documento dizia, em tom de urgência, que o funcionamento da fábrica em Thornton, Colorado, seria encerrado caso o aporte necessário não chegasse até 6 de maio. Do chão de fábrica à equipe de P&D e à própria liderança, todos estavam ameaçados de demissão.
“Nossa instituição financeira retirou os fundos disponíveis e assumiu controle sobre o restante das reservas, em uma ação totalmente inesperada”, relatou a empresa no aviso aos funcionários. “Gostaríamos de ter dado um aviso prévio maior, mas não foi possível diante do caráter abrupto dessa medida.”
Ainda assim, a Meati tentou resistir. Segundo o portal AgFunderNews, a empresa conseguiu um financiamento-ponte emergencial para manter as operações temporariamente.
Agora, a decisão está nas mãos de um juiz, que avaliará o pedido da empresa para permitir que Garber assuma a gestão da operação até a venda ser concluída.
Um momento de incerteza para o setor
A crise da Meati acontece num momento sensível para o mercado de proteínas alternativas. Em 2024, os investimentos globais no setor caíram 27%. Startups de alimentos plant-based amargaram uma retração de 64%, enquanto as de carne cultivada registraram queda de 40%.
Por outro lado, empresas que atuam com fermentação — como é o caso da Meati — tiveram um aumento de 43% nos aportes, superando pela primeira vez as plant-based. A própria Meati foi a protagonista desse crescimento, com a rodada de US$ 100 milhões em 2023. Desde sua fundação, a companhia foi uma das mais capitalizadas do setor.
Mas os desafios foram se acumulando. A Meati passou por múltiplas rodadas de demissões desde 2023, enfrentou disputas por propriedade intelectual e foi alvo de ações judiciais relacionadas a alegações de marketing enganoso. Ainda assim, conseguiu se destacar comercialmente. Em um cenário onde as vendas de carnes vegetais caíram 7% nos EUA, a Meati contrariou a tendência: seu bife à base de micélio esteve entre os 15 produtos com maior crescimento nas prateleiras em 2024, segundo dados da Circana.
A fórmula da Meati sempre foi clara: oferecer alternativas naturais, com rótulo limpo e sem o apelo de ultraprocessados. “Os consumidores não deveriam ter que escolher entre carnes de confinamento, que agridem o meio ambiente e a saúde, e produtos vegetais ultra processados, com ingredientes difíceis de pronunciar”, afirmou Graves em entrevista ao Green Queen no início do ano.
Mas mesmo com uma proposta alinhada aos princípios de saúde e sustentabilidade, a instabilidade do setor e o cenário macroeconômico têm se mostrado implacáveis. A venda da Meati, nesse contexto, é mais do que um revés isolado — é um sinal dos tempos para um mercado que busca transformar o sistema alimentar, mas ainda enfrenta um terreno desafiador pela frente.
Leia também:
Kind Kones recebe aporte da Epic Angels e acelera expansão na Ásia e Oriente Médio
Heura Foods recebe €20 milhões do Banco Europeu e projeta lucro já no 4º trimestre de 2025
Compartilhe: