Um dos questionamentos mais frequentes sobre o veganismo é se esse estilo alimentar pode sustentar o crescimento saudável de crianças. A resposta, segundo uma ampla revisão publicada na Nutrition Reviews, é sim — desde que a alimentação seja cuidadosamente planejada e acompanhada por profissionais qualificados.
O estudo, que analisou 27 pesquisas sobre o tema, mostra que crianças veganas podem crescer com saúde e vitalidade, sem apresentar diferenças significativas de altura, peso ou IMC em comparação com crianças onívoras ou vegetarianas. Além disso, demonstram menor propensão ao sobrepeso e melhores perfis lipídicos, com níveis mais baixos de colesterol total, HDL e LDL — o que sugere benefícios cardiovasculares desde a infância.
Suplementação e acompanhamento são essenciais
Apesar dos resultados positivos, os pesquisadores reforçam que uma dieta vegana para crianças exige atenção especial à composição nutricional e à suplementação, especialmente de vitamina B12, vitamina D, ferro, zinco, cálcio, iodo e ômega-3. Sem esse cuidado, o risco de deficiências aumenta — e pode afetar o desenvolvimento físico e neurológico.
Entre os principais alertas, a deficiência de B12 se destaca por seus impactos neurológicos sérios, embora seja totalmente prevenível com suplementação adequada ou o consumo regular de alimentos fortificados, como leites vegetais enriquecidos e levedura nutricional.
A vitamina D, fundamental para a saúde óssea nos primeiros anos de vida, também precisa de atenção — especialmente em períodos com baixa exposição solar. A recomendação é que o acompanhamento pediátrico inclua suplementação quando necessário, além de uma alimentação rica em vegetais verdes escuros, tofu, amêndoas e leites vegetais fortificados.
O ferro merece destaque: embora a ingestão em dietas vegetais seja alta, sua absorção é menos eficiente. Por isso, é recomendada a combinação com fontes de vitamina C (como frutas cítricas, pimentão e acerola) para melhorar sua biodisponibilidade. Em alguns casos, pode ser necessário suplementar.
Outro ponto importante é o consumo de fibras. Em excesso, pode reduzir a densidade calórica da dieta, prejudicando o crescimento infantil. Isso reforça a importância de um planejamento alimentar equilibrado, que garanta não apenas qualidade, mas também quantidade adequada de calorias.
A responsabilidade dos profissionais de saúde
Os autores do estudo destacam que ainda há um desconhecimento generalizado entre médicos e nutricionistas sobre como orientar famílias que optam por alimentar seus filhos com dietas veganas. Muitos cursos da área da saúde seguem baseados em padrões alimentares onívoros, sem incluir formação adequada sobre práticas baseadas em plantas.
“Ainda enfrentamos uma narrativa dominante que trata o veganismo como restritivo e deficiente, o que contribui para a resistência de muitos profissionais da saúde”, explica a médica Shireen Kassam, fundadora da Plant-Based Health Professionals UK. Segundo ela, a formação médica precisa avançar para contemplar outras abordagens alimentares, principalmente diante das mudanças geracionais e dos desafios climáticos.
A geração Alpha e a urgência climática
O crescimento da alimentação plant-based entre crianças também reflete transformações culturais profundas. A geração Alpha — formada por crianças nascidas a partir de 2010 — já demonstra preocupações ambientais mais agudas do que as gerações anteriores. Pesquisas indicam que dois terços dessas crianças desejam trabalhar em áreas que ajudem a proteger o planeta, e 80% de seus pais já mudaram hábitos em direção a um estilo de vida mais sustentável.
O interesse por proteínas alternativas está crescendo: cerca de 80% estão dispostos a experimentar carnes vegetais, e 74% demonstram abertura para carnes cultivadas em laboratório. Esse contexto reforça a necessidade de diretrizes claras e baseadas em evidências para alimentação vegana na infância.
O papel do setor plant-based
Para que a próxima geração cresça saudável e com consciência, é fundamental que o setor plant-based colabore com a educação nutricional, fomente a produção de alimentos fortificados e acessíveis, e incentive pesquisas que fortaleçam o embasamento científico. Também é preciso ampliar a formação de profissionais de saúde e criar diretrizes públicas específicas para diferentes fases da infância, considerando também fatores culturais e regionais.
A mensagem do estudo é clara: uma dieta vegana pode ser segura, saudável e alinhada com os valores ambientais das novas gerações — desde que bem planejada e acompanhada com responsabilidade.
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