Desde os anos 1970, com a criação do Programa Nacional do Álcool, o Brasil conhece o valor da bioeconomia. Criado como oportunidade de uso da tecnologia diante da crise global do petróleo, cinquenta anos depois o país se tornou o segundo maior produtor de etanol do mundo e o maior exportador. O nome é novo, mas a ciência é antiga e tem potencial para alavancar outras áreas da economia nacional de maneira sustentável. O tema foi amplamente debatido sexta-feira, dia 11 de setembro, durante o 3º Seminário Virtual da Frente Parlamentar da Bioeconomia com o tema “Amazônia: desafios e oportunidades da inovação e do ambiente de negócios.”

O Vice-Presidente Gen. Hamilton Mourão, que coordena o Conselho Nacional da Amazônia Legal, afirmou em seu pronunciamento o país deve centrar esforços no desenvolvimento da bioeconomia. “O Brasil tem que se apresentar para o mundo como potência agroambiental, ligada exatamente à questão da exploração da nossa biodiversidade. A bioeconomia na Amazônia deve mapear todos os produtos que temos lá, como o açaí, castanha, cacau e óleos vegetais, por exemplo.”.

Mourão afirmou, ainda, que o conselho tem três grandes vertentes de trabalho: proteção, preservação e desenvolvimento da Amazônia. ”Considero que o maior desafio está centrado no desenvolvimento, que requer uma ampla gama de medidas e um debate intenso para buscar o melhor caminho para a exploração econômica das riquezas da diversidade da região.”. Dentre as principais pautas da conselho estão o reforço do combate ao desmatamento e às queimadas; Fundo Amazônia, e a avaliação sobre a retomada de projetos ligados ao fundo que estão parados; recomposição da capacidade operacional de órgãos de fiscalização ambiental; e regularização fundiária.

Bioeconomia

A bioeconomia é um modelo econômico e industrial que utiliza matérias-primas regenerativas em substituição aos recursos fósseis e não renováveis. Dessa forma, não apenas a bioenergia se favorece dela. Com os inúmeros avanços tecnológicos e científicos, atualmente já são produzidos alimentos funcionais e biofortificados, medicamentos, plásticos biodegradáveis e muitos outros produtos e insumos.

Para se ter uma ideia, estudos realizados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico mostram que a bioeconomia movimenta cerca de 2 trilhões de euros e gera 22 milhões de empregos no mundo todo. Até 2030, as expectativas são de que as biotecnologias representarão 80% da produção de fármacos, 50% da produção agrícola e 35% dos produtos químicos. A pesquisa afirma, ainda, que 2,7% do PIB dos seus Estados-membros virão da bioeconomia. Nos Estados Unidos, já representa 5% do PIB, segundo informações das Academias de Ciências, de Engenharia e de Medicina.

Esse percentual tem potencial para ser ainda mais representativo em países como o Brasil, que tem uma grande biodiversidade de fauna e flora. São mais de 100 mil espécies animais e cerca de 45 mil de vegetais, grande parte dela se encontra na Amazônia. “A Amazônia brasileira possui mais de 500 milhões de hectares, 340 milhões ainda intactos; representa 20% da biodiversidade global. É um bioma onde ainda há muito o que descobrir. pois ali uma nova espécie é descoberta ou descrita a cada três dias. A grande questão do debate é: quanto vale a floresta? qual é o valor da floresta em termos de bioativos? Sem dúvida nenhuma é maior do que da floresta deitada, devastada se explorada de forma irracional”, argumentou o presidente executivo da Associação Brasileira de Bioinovação – ABBI, Thiago Falda.

Maurício Adade, presidente do Conselho diretor da ABBI, elencou ações fundamentais para o desenvolvimento de um ecossistema estimulante para a bioeconomia avançada na Amazônia. “Devemos mapear as matérias-primas e biorecursos e desenvolver redes de distribuição e coleta envolvendo as comunidades locais; modernizar os marcos regulatórios para desburocratizar o ambiente de inovação de negócios; incentivar a interação entre a academia e o setor público, com especial atenção à pesquisa aplicada para exploração sustentável da biodiversidade local; criar mecanismos para atração de investimentos e empresas de produtos de base biológica; estimular a criação de mecanismos para participação de produtos de base renovável e soluções de baixo carbono no mercado nacional e que permitam a competitividade desses produtos no exterior”.

Diante desse potencial, um plano para implementar medidas de desenvolvimento de bioeconomia na região está em construção. O foco das atividades econômicas atuais ainda são as commodities que, apesar de atrativas por serem produzidas em larga escala, têm valor agregado baixo. Se explorados de forma sustentável, os recursos naturais amazônicos podem ter um impacto positivo transformador na economia do país e na preservação do bioma. Por meio de investimento em pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias a partir dos conhecimento acumulados por anos pelas instituições científicas locais, é possível desenvolver novos produtos alimentícios e farmacêuticos que podem tornar o país referência mundial nessas áreas.

De acordo com o diretor executivo do The Good Food Institute, Gustavo Guadagnini, a indústria de proteínas alternativas tem muito a ganhar com o desenvolvimento de produtos e novos ingredientes de alto valor agregado na região amazônica que utilizam a biotecnologia. “O Brasil tem uma biodiversidade única, por isso também temos inúmeras possibilidades de gerar ingredientes inovadores com base em todas essas espécies de plantas amazônicas. O GFI acredita que uma agenda de bioinovação focada na região amazônica será um dos ingredientes essenciais para uma receita de sucesso na qual o Brasil poderá liderar globalmente a indústria de proteínas alternativas”, afirmou Gustavo.

A ação integrada entre os agentes econômicos, científicos e de governo é outro fator importante para que o país assuma esse papel de liderança. Cada vez mais os produtores, indústria, governos e cientistas se unem para elaborar soluções que permitam o aumento da produção global de proteínas de forma mais sustentável. Dentre as ações possíveis podemos citar melhorias nas práticas de manejo, estudos para aumento sustentável de produtividade no campo e implementação de novas tecnologias agrárias como monitoramento de plantações por drones, agricultura de precisão e fazendas verticais. O desenvolvimento de novas fontes de proteínas é outra solução que surge na construção desse novo panorama da alimentação. Por isso a indústria de proteínas alternativas surge com tanta força: é um dos caminhos necessários para o futuro da alimentação no mundo.

“Para uma reviravolta completa na Amazônia, é necessário financiar uma revolução disruptiva de ciência e tecnologia. O objetivo é criar novos caminhos de desenvolvimento econômico e social a partir dos recursos biológicos da região – esse é um discurso que nos une a todos. O resultado será a descoberta de um mundo de oportunidades que transformam os recursos ecossistêmicos amazônicos e sistemas agroflorestais em artigos altamente valiosos através da bioindustrialização, muito mais rentáveis e socialmente inclusivos do que o caminho que nós cursamos nos últimos 50 anos na Amazônia”, concluiu o cientista e meteorologista, Carlos Nobre.

Leia também a ação da Million Dollar Vegan na Amazônia.

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